segunda-feira, 2 de abril de 2012

Marilouca

- Vão tirá-la de mim! - Marilouca gritava em desespero pudente.
- Quem? Para! Acalme-se! Acalme-se, menina! Pareces louca. - repreendia o pai de alguém que fazia a barba sempre ali, na esquina, na barbearia do Seu Zé.
Ele sempre via essa menina que parecia, a seu ver um tanto perturbada, louca. Não era como as outras. Ela sempre se sentava no meio-fio, no chão seco mesmo e contava pedras, juntava insetos, falava com ela mesma e sempre tinha um livro numa das mãos, ou no chão ao seu lado. Um dia ele viu: Moby Dick. Mas nos outros todos era Dom Quixote.
- Que insana! Louca, lendo livros de loucos...
Voltando ao quadro inicial, a menina que sempre estava quieta ou falando sozinha, naquela ocasião esbravejava e se debatia como um cão raivoso embora envergonhado. Como se tivesse mordido o dono...acho que essa seria a descrição.
O cabelo dela já tinha se soltado do laço, o vestido pendia uma das alças sobre o braço. Ele notou que ninguém a segurava. Ela era um espetáculo, um show. Olhares de piedade, risos se formando, cada qual, cada um com sua reação diante da insana.
- Vão tirá-la de mim! Vão tirá-la e eu... (soluço) nem poderei fazer nada...só vê-la partir...
(rostos enrubescidos, salgadas águas)
- Tirar quem de você? Não tem ninguém aqui, mocinha...
- Vão tirar minha sanidade, vão levá-la. E o sentido de tudo, se perderá. Eu me perderei porque não sou nada sem ela...o que é uma louca sem sua sanidade? Daí serei apenas louca, sem a consciência disso. E de louca ainda me chamarão mas... e eu? Se eu não sei, se me levaram...de mim... Serei uma louca completa, motivo de chacota e o meu sentido? E o sentido que minha loucura tem pra mim?
O homem riu timidamente. A garota era louca...

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